A Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara aprovou nesta terça-feira (10) projeto de lei que proíbe o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. O texto será analisado pela Comissão de Direitos Humanos.
Parlamentares contrários ao projeto tentaram obstruir a votação, mas não conseguiram impedir a aprovação do relatório do deputado Pastor Eurico (PL-PE). O relator apresentou nova versão do seu texto nesta terça. Opositores da proposta reivindicaram o adiamento da votação, para ganhar mais tempo para analisar as mudanças feitas pelo deputado. Mas o pedido foi negado pelo presidente da comissão, Fernando Rodolfo (PL-PE), que também proibiu manifestações de representantes da comunidade LGBTQIA+ presentes.
Em seu relatório, Pastor Eurico citou Deus três vezes e associou a homossexualidade a doença em cinco oportunidades. Parecer feito por uma comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) classifica o projeto como inconstitucional e discriminatório.
Membro da Igreja Assembleia de Deus, Pastor Eurico fez um recorte religioso para elaborar seu relatório. “O comportamento homossexual é, portanto, contrário ao caráter pessoal do ser humano e, portanto, contrário à lei natural. Para além desse histórico, tem-se que as relações homossexuais não são biologicamente formatadas para incorporar a complementariedade corporal dos sexos”, alegou o deputado em seu parecer.
“É impossível tais relações gerarem a vida. A relação homossexual, portanto, não proporciona à sociedade a eficácia especial da procriação, que justifica a regulamentação na forma de casamento e a sua consequente proteção especial pelo Estado. Tentar estender o regime de casamento aos homossexuais é uma tentativa vã de mudar a realidade através de leis”, acrescentou o relator.
O deputado pastor diz que não há de se falar em discriminação ao se negar o reconhecimento do casamento de pessoas do mesmo sexo. “Se se generaliza um conceito que merece e precisa de tutela especial do Estado, o que ocorre em consequência é o enfraquecimento deste direito. O que é de todo mundo não é de ninguém. Alguns podem se perguntar: a nossa posição não é discriminatória? A resposta é: não. Discriminatório e, portanto, injusto, é tratar os iguais de forma desigual”.
Segundo ele, defensores do casamento homoafetivo pretende “alcançar o efeito pedagógico de a sociedade ver essas relações como boas e positivas, mudando a consciência social através de manipulação semântica de termos e conceito”.
O posicionamento de Pastor Eurico vai na linha oposta à do parecer de uma comissão da OAB Nacional. “Não é razoável a proibição que referido projeto quer instituir, por ser segregacionista pretender que toda a parcela de uma população seja proibida de exercer o direito ao casamento civil em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero. E nem se diga que não haveria discriminação porque pessoas LGB+ poderiam se casar com pessoa do outro sexo ou gênero como incrivelmente se alega por vezes, porque o que se discute é a discriminação que existe a pessoa que deseja se casar civilmente com pessoa do mesmo sexo e é impedida de fazê-lo”, diz trecho do parecer redigido pela Comissão Nacional da Diversidade Sexual e de Gênero e subscrito pela Comissão Nacional de Direitos Humanos e por 25 comissões estaduais da diversidade.
Ao longo do andamento do projeto, apoiadores do texto manifestaram seu caráter retaliatório, mirando o Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2011, a Suprema Corte reconheceu a constitucionalidade do casamento LGBTQIA+. Diante do aumento no atrito entre parlamentares conservadores e o Judiciário, projetos que contrariam estas decisões ganharam novo fôlego.
Casamentos civis homoafetivos são regulamentados no Brasil há dez anos. O documento da OAB é redigido pela Comissão Nacional da Diversidade Sexual e de Gênero e subscrito pela Comissão Nacional de Direitos Humanos e por 25 comissões estaduais da diversidade refuta a alegação do relator de que a Constituição reconhece como entidade familiar apenas a união estável entre um homem e uma mulher.
“Ocorre que esse argumento já foi rejeitado pelo Supremo Tribunal Federal, quando julgou procedentes a ADPF 132 e a ADI 4277, quando reconheceu que a união duradoura, pública e contínua entre pessoas do mesmo sexo constitui família conjugal e união estável constitucionalmente protegida, em ‘reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e consequências da união estável heteroafetiva’ segundo a parte dispositiva da decisão. Que tem ‘força de lei’, ante o efeito vinculante e a eficácia erga omnes que a Constituição impõe às decisões de ações de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade”, diz a Ordem.
O parecer foi elaborado a pedido da Aliança Nacional LGBTI+ e da deputada Erika Hilton (Psol-SP). Na avaliação da comissão da OAB, o projeto se reveste de “ativismo legislativo”, “um desperdício de tempo e dinheiro de contribuintes”, por ser flagrantemente inconstitucional.