Garimpo, madeira e grilagem: pesquisa liga crimes ambientais e caminho do dinheiro na Amazônia

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Degradação ainda se dá um contexto de avanço de facções criminosas ligadas ao narcotráfico na região,
21/01/2023REUTERS/Ueslei Marcelino
Degradação ainda se dá um contexto de avanço de facções criminosas ligadas ao narcotráfico na região, 21/01/2023REUTERS/Ueslei Marcelino

A destruição ilegal da floresta Amazônica tem uma finalidade econômica ligada à exploração de madeira e minérios e à grilagem de terras e é amparada por uma “rede complexa” de crimes que buscam se conectar visando um benefício mútuo.

Atividades como desmatamento e garimpos ilegais são viabilizadas por meio de um amplo uso de “laranjas” para esconder os reais causadores dos delitos ambientais e suas estruturas de financiamento.

A degradação ainda se dá um contexto de avanço de facções criminosas ligadas ao narcotráfico na região, que acaba influenciando a rede de infrações já existentes.

As conclusões são de pesquisa desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), divulgada na terça-feira (23).

O relatório “Crimes Ambientais na Amazônia Legal” levanta a atuação da Justiça nas cadeias de lavagens de bens e capitais, corrupção e organização criminosa.

O levantamento parte de análises de processos judiciais relacionados aos noves estados da Amazônia Legal. Também conta com a contribuição de entrevistas anônimas com juízes, integrantes do Ministério Público, agentes de fiscalização e policiais.

Hoje conselheira do CNJ, Daniela Madeira coordenou a pesquisa, de quase dois anos de duração. À CNN, ela disse que o foco foi “fugir do senso comum de que o crime ambiental é fruto de pessoa de baixa renda”, dando uma perspectiva da “criminalidade de grande porte”.

“Nos crimes ambientais são várias cadeias que se alimentam. E percebemos que estão tendo uma mudança em relação a isso. A pesquisa mostra, por exemplo, a figura do narcomadeireiro. Ele passa a usar a estrutura do comércio de madeira para o transporte de drogas”, afirmou.

A pesquisa identificou, por meio de entrevista, uma espécie de “ciclo triplo de lucro” em cima das terras públicas griladas, que demonstra também a conexão entre os crimes ambientais.

Depois da invasão, há o desmatamento e a venda da madeira. A área então costuma ser destinada para pasto de gado com fins econômicos. Depois, a própria terra é vendida.

Para a conselheira, uma das medidas para aprimorar o combate aos crimes ambientais na Amazônia é fortalecer a investigação. “Para que as provas sejam robustas e, quando chegar no Judiciário, você pegar não só o laranja, mas seguir o fluxo, o financiamento bancário”.

Exploração de recursos naturais

Entre as conclusões da pesquisa, está a identificação das principais atividades ligadas ao desmatamento do bioma: extração ilegal e venda de minérios e de madeira e a invasão de terras públicas com objetivo de grilagem para a exploração econômica agropecuária.

Segundo o estudo, há um padrão nos processos analisados segundo o qual a maioria dos crimes ambientais na região está diretamente à exploração de recursos naturais.

O negócio passa a se associar a organizações criminosas que operam “atividades coordenadas e complexas, engendrando um padrão de alta sofisticação na lavagem do bem e capital envolvidos”.

“Fazendeiros, madeireiros e garimpeiros, entre outros atores, constituem parte da cadeia produtiva da extração da matéria-prima ilegal, podendo estar associados ou não a grupos de milícia, com envolvimento de polícias locais ou agentes de segurança privada que atuam coagindo comunitários e detentores da posse dos bens”, afirma o estudo.

“Laranjas”

Uma das táticas para pôr em prática os crimes é o uso de “laranjas”. São pessoas que assume os negócios no papel para mascarar os verdadeiros donos que lucram com as atividades ilegais.

Em locais como Amapá, verifica-se até mesmo estratégias de “comércio de CPFs”, em que pessoas, geralmente mais pobres, como vaqueiros e caseiros, vendem seus documentos para o esquema.

Conforme a pesquisa, essa estratégia possibilita o embasamento de teses de defesa nos processos judiciais.

“Do uso corriqueiro de ‘laranjas’ infere-se que a negativa de autoria seja uma das principais teses de defesa para impedir a identificação dos financiadores de crimes ambientais, dado que a cadeia de responsabilidade é rompida nas atividades iniciais”.

Esse comportamento se dá principalmente nas cadeias relacionadas à extração de madeira e à grilagem.

No primeiro caso, segundo os dados obtidos a partir dos processos, é comum que empresas do ramo fomentam os arranjos de derrubada e venda ilegal das árvores, como incentivo à invasão de terras e a comercialização de planos de manejo fraudulentos.

Há empresas que compram a madeira que é extraída de terras indígenas ou de áreas de preservação, para posterior revenda.

No caso da grilagem, de acordo com dados dos processos, há desde fazendeiros que derrubam a floresta e simulam contratos passando a posse para laranjas até empresas agropecuárias que comercializam gado de origem ilícita para lavagem de dinheiro.

“A análise processual qualitativa constatou, portanto, que há múltiplos atores envolvidos nos casos de lavagem de dinheiro e corrupção relacionados a crimes ambientais, o que reflete a complexidade e as inter-relações entre as atividades criminosas”, diz a pesquisa.

Apesar dos padrões identificados, o estudo ressalta que não é possível tratar a Amazônia como uma “região uniforme”.

“Há peculiaridades que precisam ser observadas na leitura dos dados produzidos e na estruturação de políticas públicas de combate aos crimes ambientais. A participação de facções criminosas nesses crimes já é uma realidade em diversas regiões da Amazônia, mas há estados que ainda não foram impactados”.

Por CNN Brasil

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