O delegado que investiga o caso da biomédica investigada pela morte de Íris Martins, em Divinópolis, disse na terça-feira (24) que Lorena Marcondes realizava procedimentos cirúrgicos de grande porte na clínica e que não havia aparelhagem para monitorar os pacientes. “Sequer um aparelho de pressão tinha no local”, ressaltou Marcelo Nunes.
Lorena foi indiciada por homicídio doloso qualificado pelo motivo torpe e pela traição com dolo eventual pela morte de Íris Martins após uma lipoaspiração feita em 8 de maio deste ano.
“Motivo torpe, pois ela somente visava lucro. Outra qualificadora, chamada traição, porque ela enganava os pacientes que depositavam confiança nela. Ela falava que não era um procedimento cirúrgico e estava realizando cirurgias de alto porte ali”.
Nunes afirmou que a polícia encontrou vários medicamentos usados para procedimentos cirúrgicos, como lidocaína e outros tipos de anestésicos.
“Fora da clínica, em um veículo, encontramos o PMMA diluído em soro, substância que é proibida e que é altamente regulada”, detalhou o delegado.
Ao g1, o advogado de defesa de Lorena Marcondes, Tiago Lenoir, disse ter recebido “com uma certa surpresa esse indiciamento da Polícia Civil por dolo eventual, por homicídio doloso”.
Ele ainda disse que o “inquérito foi feito a toque de caixa” e que vai provar a inocência de Lorena.
Outros indiciamentos
Sobre os funcionários da clínica, o delegado explicou que a auxiliar da biomédica, Ariele Cristina de Almeida Cardoso, irá responder por homicídio simples. Outra profissional, que também atuou como auxiliar da biomédica no procedimento, também irá responder por homicídio simples. O nome dela completo não foi divulgado.
Os demais funcionários da clínica irão responder por fraude processual. Os nomes não foram divulgados. O g1 não conseguiu encontrar a defesa deles.
Irregularidades
Não foi encontrado no consultório da biomédica a documentação específica para a realização do procedimento em que Íris estava sendo submetida.
A perita Paula Lamounier contou que, na clínica, abaixo de uma maca, dentro de um balde, havia diversos itens que não estavam claros se haviam sido utilizados no procedimento.
Os materiais foram recolhidos e após avaliação, foram detectados vestígios de sangue e fluídos corporais de Íris, comprovando que aqueles materiais haviam sido utilizados no procedimento.
Conforme o delegado Marcelo Nunes, a biomédica Lorena Marcondes agiu como se fossem dois médicos.
“Injetou quantidade absurda de anestésico que levou a intoxicação da paciente, agiu como se fosse anestesista. Fez incisões profundas que causaram gravíssima hemorragia. Não é qualquer médico que faz esse tipo de procedimento. Tamanha foi a agressão que ela sofreu que veio a óbito”.
Ocultação de provas
O delegado regional da Polícia Civil, Flávio Tadeu Destro, afirmou que toda a cena do crime foi alterada pelos funcionários da clínica, na intenção de ocultar provas e materiais que pudessem servir para as investigações.
“Temos imagens dos funcionários da clínica deixando o local com sacos pretos retirados da clínica para serem escondidos, ocultando provas. Temos imagens de veículos entrando no estacionamento para recolher estes materiais. Não restam dúvidas do crime”, ️concluiu.
O que diz Tiago Lenoir, advogado de defesa de Lorena Marcondes
“Recebi com uma certa surpresa esse indiciamento da Polícia Civil por dolo eventual, por homicídio doloso, e com certo absurdo, com todo respeito ao delegado de polícia, ao ele dizer que houve qualificadoras dessa ação praticada pela Lorena. Primeiro que, durante a coletiva de imprensa, eles cercearam aos jornalistas algumas informações que são muito importantes para a elucidação deste caso, que obviamente a defesa vai explorar ao longo do processo.
Em momento algum, eles reforçaram que a clínica da Lorena é uma clínica legal, que tinha todos os alvarás de fiscalização em dia e que a Lorena é uma biomédica e, como biomédica, ela pode praticar determinados procedimentos. O primeiro deles é a utilização de um líquido, chamado líquido Klein, que é utilizado para anestesiar um volume maior de uma região do corpo. Ele é composto por um soro, bicarbonato e lidocaína. Esse líquido é usado por todos os profissionais da estética, sobretudo pelos biomédicos. O médico-cirurgião, àquele que faz a lipoaspiração, ele faz uma anestesia, que é local ou geral, que é completamente diferente desse líquido Klein. O simples fato da vítima ter 12 pertuitos, que são pequenas inserções na região subcutânea, demonstra que não houve lipoaspiração.
Uma lipoaspiração é um procedimento muito complexo, o qual o médico faz quatro furos enormes e utiliza cânulas enormes e uma máquina enorme para fazer a aspiração dessa gordura. E nenhum profissional da Polícia Civil que deu a entrevista coletiva hoje, seja o legista, a perita ou delegado, informa se foram encontradas na clínica da Lorena essas cânulas enormes de lipoaspiração. Eles cercearam para a população e para os jornalistas a diferença de um lipolaser para uma lipoaspiração.
A lipoaspiração requer uma anestesia complexa, uma equipe médica complexa e um local complexo para fazer isso. No caso da biomedicina, eles podem, sim, utilizar o laser para fazer o procedimento estético. E aí tem, sim, que fazer esses pequenos pertuitos, que a Lorena já tinha realizado em diversas pessoas, para passar um fio de laser para fazer esse procedimento, que é autorizado pela biomedicina, que é utilizado nesses pertuitos subcutâneos. A própria perita contou que encontrou cânulas de 15 a 10 centímetros, justamente cânulas pequenas, para fazer essas pequenas incisões. Ou seja, não encontraram nenhuma máquina de lipoaspiração.
E outra, como que uma pessoa que supostamente assume o risco de matar, presta os primeiros socorros para a vítima e fica lá até o final, inclusive ela foi presa em suposto flagrante delito. Logo que a vítima passou mal, a Lorena acionou uma equipe médica, que chegou com menos de dois minutos e começou a fazer as massagens cardíacas. A própria clínica da Lorena que fez o contato com o Samu para chegar e fazer todos os procedimentos. E obviamente a paciente teria várias hemorragias internas, pois ela foi massageada por mais de uma hora, seja pelo Samu ou pelos médicos que chegaram antes na clínica. (…) E, curiosamente, o prédio onde fica a clínica da Lorena, que inclusive o Ministério Público está estabelecido lá, não comporta uma maca de Samu. Qualquer pessoa que for ao prédio, verá que o elevador é muito estreito, pequeno e não comporta uma marca do Samu. Porém, a paciente saiu viva da clínica da Lorena e foi falecer mais de 10 horas depois no hospital.
Então, o que eu percebo da Polícia Civil é que eles encontram um suspeito e vão atrás de um culpado, sem analisar os diversos ângulos que devem ser analisados com toda seriedade para a busca da verdade. Isso, obviamente, a defesa vai explorar no âmbito judicial, caso o Ministério Público denuncie a Lorena pelo que a Polícia Civil está demonstrando”.
Por g1